Frases para lembrar:

"Tudo antes de ser fácil é difícil."

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Cotas raciais são inconstitucionais e absurdas, afirma procuradora

Roberta Fragoso é contra as cotas raciais no Brasil: “Há outros meios de incluir os negros”

É uma árdua tarefa se insurgir contra as cotas raciais em um país que tem mais que a metade de sua população declarada como negra. Sem medo de retaliações, Roberta Fragoso, procuradora do Distrito Federal, foi uma das pessoas que se posicionou publicamente contra este tipo de ação afirmativa. A advogada não possui motivações políticas e nem participa de movimentos sociais: sua tese sobre o tema surgiu após 12 anos de estudo e resultou no primeiro lugar do curso de mestrado da Universidade de Brasília (UnB). Alguns a apoiam, mas ela confessa que suas ideias e argumentações incomodam a maior parte das pessoas que as ouvem.

“Eu não sou contra os negros, eu não sou contra a minoria, eu entendo que o Brasil é um Estado Social que quer incluir os pobres. Quando você tem uma pessoa que é desigual do ponto de vista fático, o Direito tem que proteger isso. Eu sou totalmente a favor de cota para deficiente físico, de filas diferenciadas para gestantes e idosos, de vagas preferenciais em estacionamentos. O problema é: a cota racial é a melhor forma para integrar o negro no Brasil? Eu sou a favor da integração. Agora, como a gente vai fazer isso?”, questiona.

Por conta do seu ponto de vista sobre o assunto, Roberta já passou por maus bocados. Já teve seu carro pichado – segundo ela mesma, com xingamentos e ofensas – e já precisou sair escoltada por seguranças de vários lugares devido às manifestações fervorosas de diversos grupos. “Eu já apanhei muito nessa história, mas não me constranjo de falar. Porque eu sei que não sou racista. Eu tenho preconceito com gente preconceituosa. Em relação a tudo”.

Segundo a procuradora, estatisticamente os negros se encontram na base da pirâmide social brasileira. Pelo ponto de vista da igualdade material, que está previsto na Constituição, há uma vírgula interpretativa vista pelos juristas. “A questão de ‘tratar desigualmente os desiguais, na medida das suas desigualdades’ é indiscutível. Mas o que faz uma pessoa ser desigual? Se alguém é cego, esse alguém tem um impedimento. A mesma coisa com uma grávida. Qual é a argumentação que diferencia o negro do branco? O primeiro ponto: ele está na base, isso é fato, todas as pesquisas mostram. Mas isso acontece porque ele é negro ou porque ele é pobre? Se o problema é a pobreza, uma cota racial não vai tirá-lo desse lugar. Se não atacarmos a verdadeira causa, a questão nunca vai se resolver”, defende.

Um dos pontos abordados pela jurista, com respaldo científico, é o da desmistificação do termo raça. Para ela, a classificação das pessoas por cor trata-se de uma construção social. “Toda discussão racial gravita em torno 0,035% do genoma humano. O que isso quer dizer? Cada ser humano possui cerca de 25 mil genes, desses, apenas 10 determinam a cor da sua pele. Essa descoberta é recente, aconteceu em 2003. É por isso que é possível um casal de negros tenham filhos brancos, sem nenhum caso de albinismo. São tão poucos genes, que se tiverem algum ancestral branco, é possível que eles tenham filhos mais claros. É possível que gêmeos univitelinos tenham cores diferentes. Geneticamente, não faz o menor sentido se falar em raças”.

Apesar de pregar que não existem rótulos raciais, Roberta admite a existência do racismo no Brasil e acredita em maneiras alternativas de combatê-lo. “Para poder desconstruí-lo, é necessário derrubar a crença em raças. Como se derruba este mito se existem legislações sobre cotas raciais? Existem outras formas de lutar contra o racismo. Punindo da forma mais efetiva possível. Hoje em dia, por exemplo, quando você xinga alguém com base em raças isso não é crime de racismo, é injúria racial – que já é relativizado, enfraquecido, a pena é mais leve. Paralelamente a ser contra cota, eu sou a favor de que o crime de racismo seja considerado não só inafiançável, como imprescritível e hediondo”.

O país pioneiro na implementação do sistema de cotas foram os Estados Unidos, apesar de ele ter valido apenas por nove anos. A advogada afirma que o grande problema do Brasil é querer copiar este modelo que foi criado para uma realidade completamente distinta daquela que reina em nosso território. “O risco que a gente corre aqui não existe nos EUA, porque lá já havia segregação total entre negros e brancos, já havia identidades paralelas. A gente precisa disso? Lá, há um critério objetivo, o da gota de sangue. Se você tiver qualquer ancestral negro, ainda que seja loiro do olho azul, você vai ser considerado negro. Aqui, agora estão inventando critérios objetivos para poder identificar raças. Inventaram tribunais raciais. A UnB, por exemplo, tem uma comissão secreta para julgar a cor das pessoas”, critica.

Roberta diz ainda que o problema das cotas étnicas no Brasil, historicamente, é de que - ao contrário do que aconteceu em terras norte-americanas - a miscigenação em nosso país é total, o que impede que uma pessoa seja classificada como preta, branca, amarela, parda ou indígena. Na parte de cima do continente, a mistura entre raças era considerada crime até o século passado. Outro fator defendido por ela é que a escravidão no país não aconteceu por conta de racismo, e sim por questões financeiras.

A principal argumentação que sustenta as ações afirmativas para os afrodescendentes é a da teoria compensatória, o pagamento da dívida por anos de exploração. “Hoje há cota racial para negro porque de alguma maneira a gente tem que indenizar o passado escravocrata. Em relação a isso, existe uma argumentação do geneticista Sérgio Penna: como no Brasil a miscigenação foi enorme desde o início da colonização, é impossível você querer fazer uma correlação necessária entre cor de pele atual e ancestralidade de DNA. Em outras palavras, é totalmente possível que um negro hoje de aparência descenda de europeus e de senhores de engenho. Só são 10 genes”.

A procuradora apresenta uma alternativa para a problemática. “Se 73% dos pobres são negros, uma cota social vai integrá-los majoritariamente sem correr os riscos da racialização do país. Quem vai ficar de fora são os poucos negros ricos que representam quase nada perto dos brancos pobres que serão beneficiados. Então o meu lema é cota social sim, racial não. A gente não precisa copiar um modelo que foi criado para resolver um problema de racismo de uma sociedade que não é a nossa”, finaliza.



Nenhum comentário:

Postar um comentário